Descobertas mais modernas no tratamento do câncer

Participei recentemente de mais uma edição do congresso da ASCO — a Sociedade Americana de Oncologia Clínica — que acontece todos os anos em Chicago. É o maior evento do mundo na área, com mais de 50 mil participantes de vários países, e uma fonte riquíssima de conhecimento. O que é apresentado ali tem o poder de mudar a prática médica já na segunda-feira seguinte, quando voltamos ao consultório. E este ano, o congresso trouxe avanços importantes no combate ao câncer.

Um dos destaques foi um estudo sobre melanoma, um câncer de pele agressivo. Os pesquisadores apresentaram resultados preliminares muito promissores com uma vacina de RNA combinada com imunoterapia. Essa vacina é parecida com as que foram desenvolvidas para a COVID-19, e, nesse estudo, mostrou respostas robustas em pacientes com alto risco de recidiva. A maioria dos pacientes tratados com essa combinação não teve retorno da doença, quando comparados aos que receberam apenas imunoterapia. É uma pesquisa de fase 2, ainda inicial, mas abre caminho para estudos maiores.

É importante lembrar que falar em vacina contra o câncer não é algo novo. Há décadas tentamos desenvolver imunizantes que funcionem de verdade. O que muda agora é que talvez estejamos diante de algo com aplicação clínica real. No caso do melanoma, isso faz ainda mais sentido porque é um tipo de câncer com forte interação imunológica. Muitas vezes, o próprio corpo consegue fazer o tumor desaparecer, mesmo quando ele já estava evoluindo. Isso reforça a ideia de que, ao combinar a vacina com a imunoterapia, podemos potencializar a ação do sistema imune.

Além disso, outro estudo sobre melanoma apresentado na plenária da ASCO mostrou que a imunoterapia antes da cirurgia pode ser eficaz. Tradicionalmente, fazemos primeiro a cirurgia e depois o tratamento complementar. Neste estudo, inverteu-se a ordem: dois ciclos de imunoterapia antes da cirurgia, com resultados muito expressivos. Em cerca de 60% dos casos, não havia mais sinais do tumor após a cirurgia. Isso pode significar, no futuro, menos necessidade de tratamentos adicionais, menos efeitos colaterais e até um encurtamento do tempo de tratamento.

No câncer de pulmão, outro tema de grande destaque no congresso, vimos avanços tanto em estágios avançados quanto em fases mais iniciais da doença. A presença de marcadores moleculares, como mutações no gene EGFR, permite hoje direcionar o tratamento com mais precisão. Estudos mostraram que, após a quimiorradioterapia, o uso de uma droga específica para esse tipo de mutação aumentou a sobrevida dos pacientes. Isso reforça a importância de fazermos o mapeamento genético do tumor.

A imunoterapia também foi muito discutida em câncer de pulmão. Em vários casos, os pacientes que respondem bem ao tratamento podem interromper a medicação após dois anos sem prejuízo na eficácia. Isso é relevante porque além de ser um tratamento caro, a imunoterapia também pode causar efeitos colaterais graves, como reações autoimunes.

No fim das contas, o combate ao câncer passa por três pilares: inovação científica, acesso ao tratamento e prevenção. Mesmo com tantos avanços, ainda precisamos focar no rastreamento precoce, na educação da população e na oferta de exames para grupos de risco — como fumantes e ex-fumantes, no caso do câncer de pulmão.

A ciência está caminhando. E eu sigo acompanhando de perto, para levar a cada paciente o que há de melhor, mais seguro e eficaz no combate ao câncer.

Veja o vídeo completo da entrevista sobre o assunto.

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